
"No segundo livro da série Cidade da Música, você vai conhecer Camila. Ela é neta de japoneses e filha de pais muito rigorosos que têm grandes planos para ela e para sua irmã. Desde pequena, aprendeu que precisava se esforçar mais, que precisava ser melhor, que não existia tempo a perder na adolescência e que sua inteligência e seu talento deveriam levá-la longe. Camila, então, trocou as festas das amigas por treinos de balé, e a vontade de viajar o mundo afora pela consagrada Academia Margareth Vilela. Sua vida inteira estava programada e organizada. Até que uma crise de ansiedade a fez perceber que tudo ainda podia mudar e, depois de conhecer Vitor, um garoto desengonçado e cheio de sardas que tocava violino, a vida mostrou à Camila que uma dose de hiphop poderia fazer os dias dela mais felizes."
O segundo livro da série Cidade da Música de Babi Dewet, que também se passa na Academia Margareth Vilela como o primeiro volume, retrata Camila Takahashi, uma jovem bailarina de família japonesa que convive com a busca pessoal pela perfeição no ballet e o papel em um solo importantíssimo para sua ascensão profissional na dança, com uma pressão tanto interna quanto proveniente da família.
Tudo ocorre normalmente no dia a dia de Camila até o momento em que desenvolve uma ansiedade que lhe traz crises repentinas em diversos momentos, quebrando sua rotina tão bem definida e gerando questionamentos internos que lhe fazem sofrer de uma maneira inédita. Apesar de minha vida não ser nada parecida com a de Camila, de certa forma me identifiquei um pouco com a personagem mais do que com a protagonista do primeiro livro da série, e torcia pelo momento que ela se livraria de algumas amarras que a deixavam tão intensamente sobrecarregada e superaria as novas dificuldades que enfrentava.
Camila, além de ter Clara, sua grande amiga na Academia, conhece Vitor, um violinista em quem encontra um primeiro amor inesperado e uma relação confortável que não sentia com nenhum outro garoto – principalmente por ser o tipo de pessoa que deposita todo seu tempo e atenção em seu ofício e não em relacionamentos e momentos de lazer. Vitor é um personagem gentil e divertido que aprecia e apoia Camila de maneira admirável, e lhe apresenta, literalmente, o mundo fora da Margareth Vilela e do ballet clássico, proporcionando momentos de descontração cheios de diversidade musical e pessoas igualmente plurais que a mostram o quanto de riqueza há em outros ritmos e, consequentemente, que não há problema em se permitir relaxar e se divertir após tanto esforço.
O livro traz também uma discussão interessante a respeito do racismo. Camila, sendo uma mulher de descendência japonesa, passou a vida ouvindo os mais diversos tipos de comentários referentes à sua origem, desde os mais velados até os mais pejorativos, e durante a história vai compreendendo o peso disso cada vez mais, se percebendo e percebendo os outros, trazendo o leitor para pensar junto. Os comentários, mesmo os mais inofensivos, não são corretos e ninguém merece simplesmente ser rebaixado e limitado à estereótipos preconceituosos. No decorrer da narrativa, Camila conhece o "Clube da Diversidade" da Academia, onde outros jovens (negros, muçulmanos, asiáticos etc.) se encontram para discutir a respeito da vivência em ambientes onde há sempre algum tipo de discriminação e, certamente, a predominância branca – e onde todos já ouviram algum tipo de comentário ofensivo referente à sua origem ou religião, seja durante seu período na Margareth Vilela ou durante toda a vida. Nesse espaço, Camila encontra pessoas que a acolhem e a fazem refletir e compreender mais todas essas problemáticas.
Babi Dewet, apesar de não fazer parte de nenhuma minoria, pelo menos na série Cidade da Música (não cheguei a ler outros livros da autora), embora não seja o tópico principal de suas histórias e nem super aprofundado, demostra que tenta abrir espaço para personagens diversificados em seus livros, sejam amarelos, negros, da comunidade LGBTQI+ etc.
Algo que eu já havia percebido um pouco no Sonata em Punk Rock, mas nesse me chamou ainda mais a atenção, foram alguns vícios de escrita da autora, com certas frases e descrições repetitivas de modo que se tornavam um pouco cansativas – faltou um esforço para valorizar mais algumas descrições que facilmente poderiam ser substituídas. No geral, a escrita de Babi Dewet não é a que mais me impressiona se comparada a muitas outras, mas fora esses vícios, é muito tranquila de ler. Além disso, também percebi algumas falhas que passaram despercebidas na revisão do texto, com pequenos erros ou frases onde claramente faltava alguma palavrinha com uma frequência que não vi no primeiro livro. Porém são detalhes, nada que tenha comprometido a compreensão da história.
Não foi um livro grandioso que me marcou profundamente, mas ainda é uma leitura bacana, que traz discussões importantes de maneira leve e o bom e velho romance. Além de momentos mais emocionantes em que Camila se vê realizando feitos tão importantes para ela que pensava que não teria mais chances de realizar, principalmente no final – visualizei as cenas finais quase desejando que estivesse assistindo a um filme ou uma série (acho que seria bem interessante de ver alguma adaptação).
Camila amadurece durante a história e é interessante observar sua evolução – uma pessoa um pouco menos presa à pressão e à ideia da perfeição e um pouco mais leve. Com a noção que não lhe falta esforço para conseguir o que quer, e que nem sempre a vida e as pessoas são justas, mas que não tem culpa se nem todos a reconhecem como deveria. E que tem consciência – e esse é o fato mais bacana de se levar da história – que não pode ser perfeita, que não há como ser perfeita, mas que pode sempre fazer o melhor que lhe for possível e que isso já é o suficiente.
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